domingo, 30 de maio de 2010

A INVISIBILIDADE -- UMA PANDEMIA

A invisibilidade é uma “doença” que atinge grande parte da humanidade. Prima-irmã da discriminação e da indiferença, já é crônica em algumas categorias de trabalhadores, idosos, pessoas portadoras de necessidades especiais, algumas etnias e classes localizadas na base da pirâmide social.

Quando se instala nas relações interpessoais e familiares assume algumas peculiaridades.

Neste último caso, vitima mulheres, crianças e homens, independente dos papéis que assumem nos ambientes. Com relação as mulheres, idosos e as pessoas portadoras de necessidades especiais, tem raízes cravadas na ancestralidade. Não vou entrar no mérito das causas antropológicas, nem pretendo ser repetitiva, nem óbvia.

Não podemos e nem devemos generalizar a invisibilidade. Considero-a uma “doença” degenerativa, degradante e excludente. É insidiosa, indiferente à raça, classe social ou nível cultural. Entretanto, só atinge os que são ou se percebem fracos, os omissos ou os covardes. Embora considere mais covarde e omisso quem favorece ou determine a invisibilidade de alguém, através de frestas das suas fraquezas.

Ainda, no caso das relações familiares seu diagnóstico é confundido com “crise”, este saudável processo que banalizamos. Porque crise tem características outras; é pontual, tem principio e fim, é transformadora e, muitas vezes, assume caráter libertário.

O que quero registrar aqui é a necessidade de todo ser humano ser “visível” ao outro e toda existência ser considerada relevante. E isto seria determinado e condicionado pelo equilíbrio e autonomia emocionais de um lado e solidez de valores e compaixão do outro.

O grande empecilho são os condicionamentos deformados que nos contaminam, impostos pelo mundo e aceitos passivamente: machos e fêmeas, cada qual assumindo, respectivamente, os estereotipados papeis de “predadores” e de “caça” abatida e indefesa. Algozes usando como armas negligência e prerrogativas imaginárias e vítimas anulando-se por comodismo ou por fraqueza, numa "guerra" sem vencedores.

Pais e mães negligenciando filhos que, livre ou irresponsavelmente gestaram e povoaram o mundo, delegando a terceiros a responsabilidade de formá-los. Sentenciando, assim, o futuro a uma geração de seres que, de humanos, só tem a classificação no reino animal.

A intolerância entre etnias e crenças desconhece que o conceito de raça já foi modificado e avançado para o de uma única raça, a Humana e que o DEUS que muitos usam como álibi para a intolerância não fosse um ser uno, cósmico e onipresente.

Certamente que devemos dividir responsabilidades já que não superamos “explicações” e “justificativas", nem demos um salto de qualidade em questões existenciais básicas. O mundo mudou e embora tenhamos provocado estas mudanças, muitos de nós não as acompanhamos e nem as compreendemos. Infelizmente!

Refiro-me aqui, aos homens e mulheres contemporâneos que ainda se mantêm reféns do casal que vivia em cavernas; aos que desconhecem os avanços da ciência quanto às possibilidades a que tem direito os “ditos” deficientes; os indiferentes à renovação de conceitos étnicos, culturais e aos imunes ao resgate e solidificação de princípios éticos

A ausência desta consciência enfraquece a Humanidade. Os seres, ao se alienarem dos anseios uns dos outros, privam-se de um universo rico, em diversidade, possibilidades e emoções. Empobrecem-se os sonhos. E com eles as perspectivas e as esperanças.

ALICE ROSSINI

domingo, 23 de maio de 2010

O “JOVEM INQUIETO”


Pare na frente da banca da esquina da sua rua, e veja as fotos das modelos nas capas das revistas de moda feminina. Todas as manequins magrinhas, com a estrutura óssea destacando-se em proeminentes relevos. Infelizmente, as mulheres são constantemente bombardeadas com imagens de ideais corporais que beiram o impossível já que em muitos casos, ser magrinha requer expor o corpo a sacrifícios que, quando se tornam crônicos, abrem caminho à morte prematura.
Esta questão já era motivo de alarme generalizado nos centros de moda e entre a classe artística como sendo uma praga que ataca meninas e mulheres que são modelos, atrizes ou querem sê-lo. Mas isto não é tudo!

Li numa página de internet, que já nem me lembro qual, que um dos mais famosos construtores de manequins para lojas, uma empresa chamada Rootstein, lançará no próximo mês um modelo masculino novo chamado de “Jovem Inquieto”. O boneco terá como medidas, “estonteantes” 90centímetros de peito e 68 de quadril.

Segundo estatísticas, em 1990 os homens ocupavam apenas 10% do contingente de pessoas que sofriam de desordens alimentares. Hoje, já são 25% do total. A procura comercial pelo “Jovem Inquieto” reflete a proeminência de novo modelo raquítico de homem ideal, que é quase impossível de ser alcançado pela a maioria dos seres humanos normalmente formados.

É óbvio que este novo modelo de manequim, gotejou das paredes andrógenas do mundo da moda, onde a percepção geral é que o talento dos grandes costureiros se resume em desenhar roupa para esqueléticos, ou, longe de ser preconceituosa, a maioria dos “designers” reflete seus gostos ou desgostos baseados na sexualidade de cada um. E isto é preocupante porque, se o “Jovem Inquieto” retrata não só no físico como na aparência, um ser humano entre 15 e 20 anos, de formas e gênero indefinidos.

Isto pode até ser um alento subliminar, numa interpretação mais radical, a práticas promíscuas e até criminosas como a pedofilia. Esta, no momento, já tem até defesa entre uma estranha gama de psicólogos e psiquiatras, que estão qualificando-a como outro tipo de sexualidade, ou, um distúrbio psicofísico tipo alcoolismo ou vicio em outras drogas.

Era só o que nos faltava! Se bem entendo, já não se trata de fazer a sociedade aceitar naturalmente a homossexualidade, o que eu apoio e respeito. Agora se trata de convencer a mesma que ser só heterossexual é ser careta! Será que vem por aí uma campanha para enriquecer a condição de heterossexual, agregando o termo “homo fóbico”, como sinônimo?

O argumento de que o “Jovem Inquieto” está baseado na atitude e modelo físico da juventude atual é falho e absolutamente devedor de suporte estatístico. O talento de cada um dos artistas que desenha obras de arte em forma de roupa, não pode ser desculpa quando reflete possíveis e prováveis desvios comportamentais, sociais e pessoais, principalmente dentro do seu círculo de influência. A mim me parece que Jennifer Lopez, por exemplo, dona de uma bundinha linda, se vê muito melhor em qualquer das peças desenhadas pelos grandes estilistas, do que qualquer “raio-x ambulante” das passarelas de Milão, Paris e Nova York.

Os homens na sua maioria absoluta, independente muitas vezes da sua sexualidade, não se definem principalmente pela sua aparência física. A razão para este aspecto é que o poder deles não deriva da mesma. Já as mulheres, entram no prejuízo porque juram de pés juntos que a fonte do seu poder tem como suporte principal a sua aparência. Se juntarmos a esta verdade, o fato de que a grande maioria dos “designers” que comandam o mundo da moda é homossexual, aí está servida uma salada tóxica de idéias sobre padrões de beleza distorcidos e genuinamente “brochantes”.

Homens preparem-se. Daqui a muito pouco tempo, seremos nós a necessitar de terapias e mensagens destinadas a levantar a nossa auto-estima, nos lembrando, a cada momento, que é ótimo ter curvas e ser gordinho.

Ciao, Vou andando... estou morrendo de fome!

FERNANDO TROVADOR

quarta-feira, 19 de maio de 2010

A MALDIÇÃO DOS NÚMEROS

Sabe aquela historinha dos carneirinhos que todo o professor de matemática conta para explicar a origem dos cálculos matemáticos? Bem, esse maldito conto sobre o dono de carnerinhos que teve de inventar a noção de “contagem” para cuidar dos animais nunca deveria ter acontecido. Eu, se estivesse lá na época, provavelmente degolaria o maldito criador antes que ele pensasse em alguma coisa que se parecesse com um “número”.

Minha aversão não é contra matemática, muito pelo contrário, algumas relações aritméticas são tão perfeitas que impressionam. O que eu poderia amassar, pisotear e jogar no lixo são os miseráveis números. Não há símbolo mais medonho e mais compressor do que eles. E o pior é que os bandidos se disfarçam, fazem-se de bonzinhos organizando nosso dia-a-dia, nos dizendo as horas, ajudando a pagar contas e melhorando o comércio. Mas se esses chatos não existissem, nenhuma dessas atividades maçantes e repugnantes existiria. Seria um grande favor, diga-se de passagem.

Números são como algemas. Como correntes que nos prendem às coisas como se fossem parasitos intracelulares obrigatórios. Um verdadeiro vírus para as pessoas. Um câncer para a sociedade. Um câncer muito bem maquiado. E por que tamanho ódio? Números destroem sonhos, acabam com a felicidade e resumem todo o processo num só resultado com poucos mais de dois dígitos.

Pense assim: uma pessoa esperando ansiosamente o dia inteiro para ir até o zoológico com a família. A felicidade e a excitação da família é extraordinária, mas mesmo que todos façam um esforcinho para sair de casa às 17h, basta ver uma placa escrito “Aberto até 16h” para todos desanimarem. Quer dizer, a alegria se dissipou no instante em que avistaram aquele grande número gerado da multiplicação de 8 com 2.

Não importa o quão grande e magnífico seja o seu sonho de se tornar o homem mais rico do mundo. Basta abrir seu saldo bancário para desanimar de vez. Mesmo que você queira se tornar uma modelo famosa, subir numa balança e ver aquele número ultrapassar 90, fará você derramar lágrimas. E não importa o quão determinado você esteja para descobrir a cura do AIDS. Basta que você não esteja entre o número de selecionados para a faculdade de medicina para que seu sonho vire cinzas.

Um aluno pode muito bem estar transbordando de confiança quanto a uma prova. Pode ter aprendido todo o assunto e memorizado todos as dicas necessárias, mas um erro na marcação das questões pode fazer com que sua nota não ultrapasse a média. Quer dizer: o moleque era inteligente e esperto, tinha estudado até descolar os olhos, mas um número resumiu todo o seu progresso em “Abaixo da Média”.

A questão é que começamos a nos achar números, visto que o câncer já consumiu todo nosso corpo. Somos o número da balança. A dosagem do remédio. A hora da reunião da empresa. O dia da viagem. A nota da escola. A temperatura do dia. O número do celular... Não é ato que, antes de mais nada, a gente só é gente se tiver CPF e RG.

RAFAEL NEVES - Estudante de 15 anos

quinta-feira, 13 de maio de 2010

AMIZADE, UMA NECESSIDADE BÁSICA

Fazendo uma faxina em minha memoria e pensando nas pessoas que conheci, troquei experiências e convivi me deparei com um débito de amigos. Tenho muito poucos, mas muito bons! Gostaria de ter muitos mais!

Alguém disse que a amizade é desnecessária, como a filosofia ou como a arte se as compararmos com as outras necessidades humanas. Não lhes dão valor para a sobrevivência humana. Mas, ao contrário disso acredito, sem sombra de dúvida, que a amizade é o ponto central da minha e de todas as vidas. Algo que valoriza a vida e torna a sobrevivência amena.

É através da amizade, da troca que fazemos com nossos amigos que assumimos a forma da pessoa que fomos, somos e seremos.

O valor da verdadeira amizade é infinito e impagável. Nada pode ser comparado ou jamais substituir a conexão genuína entre duas pessoas que não somente se compreendem, mas desejam apenas o melhor entre si. É um presente, um tesouro!

Uma amizade sustentável e longa é rara e muitas vezes quase impossível de se encontrar, manter ou, até mesmo, de ser crível. Entretanto, quanto mais fé eu tenho em mim e mais amor eu me dou a mim mesmo, mais conexões genuínas eu serei capaz de atrair e manter em longo prazo. Parece simples, não é? E em realidade me parece que é assim simples e direto.

Embora existam fórmulas para o sucesso, assim como um sem número de mapas ilustrativos, a vida nem sempre segue caminhos pavimentados. Infelizmente, emergências imprevistas e outros fatores inesperados, podem levantar obstáculos nos nossos caminhos, sombras e folhagens que obscurecem a nossa visão e nos deixam inseguros, cegos e perdidos na nossa "viajem".

A minha natureza confiante tem sido ao mesmo tempo, um presente e uma fraqueza. Quando uma pessoa me diz alguma coisa, eu sempre tomo essa assertiva pelo seu valor nominal. Nem sequer me ocorre inferir algum outro significado. Aceito a mensagem como sua palavra de honra e depois me certifico da mesma, observando as ações que solidificam as palavras.

Eu confio! Quem me conhece bem sabe que assim sou! Isto tem mantido meu coração aberto a muitas possibilidades na vida. Mas tem me dado de igual modo, muitas decepções que me deixam confuso e inseguro sobre a melhor forma de decifrar os seres humanos.

Convivendo com este “zig” e “zag”, hoje percebo muitos mais “zigs” que “zags”. O tempo e as lições aprendidas me levam hoje a ter uma visão mais cristalina e ampla, vendo algumas pessoas pouco claras, escondidas por traz de armaduras, com formatos mutantes, mas que no final, sempre terminam por definir-se. E isto é o que importa!

Um tema que sempre flutua nas minhas incursões ao reino da confiança, é a minha intuição. Posso afirmar, orgulhosamente, que ela raramente me engana! Posso até ter demorado mais tempo que o necessário para tomar iniciativas, mas administradas pelos os meus instintos, as minhas ações me guiaram ou me alertaram para o fato de que algo não se assentava comodamente em meu coração.

As minhas lições, por conseguinte, minimizavam o tempo de espera e por causa disso eu sou infinitamente agradecido aos meus instintos. É aí que a presença da verdadeira amizade se torna infinitamente inestimável. Um amigo verdadeiro sempre nos faz lembrar tudo que nos enche o coração. Nossos amigos são o espelho quando nós, invariavelmente, perdemos de vista ou esquecemos quem somos e no que acreditamos.

Eles nos recordam que as pessoas não se ferem propositalmente e podem tratar uns aos outros como se o fizessem a si mesmos. Eles nos lembram que o amanhã nos reserva infinitas saídas e iguais possibilidades que nos enchem de energia e autoconfiança para que sigamos o nosso caminho seja como, quando e onde escolhamos segui-los.

Para sempre eu serei grato a todos os meus genuínos e verdadeiros amigos. Serei grato em cada momento da minha vida. Eles fizeram que eu tomasse consciência do meu verdadeiro valor como ser humano, ampliou a intensidade da minha gratidão por todas as intermináveis alegrias que a minha vida hoje reflete e as que ainda estão por acontecer.

Não caminhes à minha frente, pois serei capaz de não te seguir.
Não caminhes atrás de mim, pois serei capaz de não te liderar.
Caminha ao meu lado e seremos amigos!

FERNANDO TROVADOR

sábado, 8 de maio de 2010

EDITORIAL

Pelo segundo ano fico imaginando uma forma não convencional de homenagear as mães. Abstraindo os interesses comerciais, reconheço como uma homenagem mais que merecida. E é sobre o jargão que se repete sem muita reflexão que “todos os dias são das mães” que quero homenagear a mãe em que nenhum dia é dedicado a ela. Aquela que a todo o momento questiona onde e em que momento errou. Aquela que chega a duvidar da sua capacidade de cumprir uma função biológica que quase todas desejam e se acham naturalmente capazes. Aquela que sai do seu “script” materno e, por amor à sua cria é capaz de cometer atos aparentemente insanos e cruéis. Aquela, cujo amor e sentimentos não são reconhecidos por uma sociedade que acredita que algumas pessoas se acostumam ao sofrimento e à privação. Que a intimidade com a dor e a insegurança endurece seus corações e relativiza suas perdas.

Refiro-me às mães de filhos que fogem aos padrões legais e morais impostos pela sociedade e, a despeito de os saberem transgressores os amam, protegem e estão sempre presentes nas suas vidas.

Dias desses, vi através da televisão duas histórias que me chocaram tanto quanto me comoveram. O choque deveu-se à crueldade com que o sistema obriga a quem só deveria amar e proteger, a acorrentar seu próprio filho, para que não saísse em busca de droga, enquanto ela tinha que sair em busca de comida. A outra, para proteger o filho da sanha violenta dos traficantes foi, pessoalmente, encontrá-los em busca da substância mortal que aplacaria o vício que o consome.

Nas duas circunstâncias, a justiça e a sociedade condenaram as mulheres. Fácil invocar leis e padrões morais quando não estamos no “olho do furacão”. Quando o fato é tão estranho à nossa realidade nos esvaziamos de sentimentos que possibilitam a isenção e a frieza para evocar uma solução jurídica.

Não vou ousar emitir minha opinião sobre o assunto da mesma forma que, no momento em que assisti a reportagem, somente uma imensa sensação de compaixão preencheu meu coração e minha razão: E se fosse meu filho? Projetei-me. Repasso a pergunta. E se fosse seu filho?

Difícil a resposta, não? Será que precisaríamos acorrentá-los para impedir que se drogassem? A maioria de nós teria condições intelectuais e financeiras para buscar ajuda mais civilizada. Será que sairíamos à procura da droga para proteger nosso filho da violência do tráfico? Mais difícil, ainda, a resposta. Muitas de nós acham que não chegaríamos a este ponto.

Não sei como os dois casos terminaram embora, pessoalmente, creio que seus desfechos serão tão sombrios quanto cruéis as circunstâncias que lhes fizeram vir a público.

Como imagino que fatos como estes são mais comuns do que nossa realidade é capaz de imaginar, da mesma forma acredito que existem situações que devem estar fora de qualquer julgamento moral ou emocional, mas sim analisados à luz da "Justiça sem venda nos olhos", dedico este Editorial onde pretendia homenagear todas as mães no seu dia, a estas duas criaturas, das quais não sei sequer seus nomes. Somente parte das suas tragédias pessoais, e do quanto seu amor foi e é incondicional a ponto de transgredir todas as normas do bom senso, achando, ingenuamente, que protegiam seus filhos.

Este é o lado real, cruel, injusto, lacrimoso, recheado de decepções e órfão de esperanças onde padecem muitas mães que vivem no mesmo planeta que nós, bem mais próximas do que imaginamos.

A elas, nossa homenagem.

segunda-feira, 3 de maio de 2010

O NUMINOSO


Não ter opção religiosa nunca foi um problema na minha vida. Embora minha idéia de Deus tivesse sido antropomórfica por curto período da minha vida, nas horas difíceis sempre transcendo conceitos e realidade em busca de compaixão como todo ser humano consciente de sua fragilidade. Na “agonia” aconchego-me ao Deus da infância, sentado num trono, barba branca e, misericordioso o suficiente para “solucionar” e “acolher” a necessidade que, aquela circunstância me levou até ele.

Sempre pensei que deveríamos possuir princípios e valores que abrangessem uma filosofia capaz de sustentar e responder, minimamente, questionamentos existenciais e aos que a ciência ainda não consegue explicar. Daí minhas incursões pelo Budismo que, despindo-o das questões místicas e religiosas, responde a muitas das questões que alimentam as inquietações humanas e as minhas, em particular.

Mas o tempo, testemunha e coadjuvante tanto da nossa ignorância quanto da nossa lucidez nos obriga a fazer questionamentos mais sérios e mais urgentes, diante da contundência com que as circunstâncias nos surpreendem.

Não perco tempo, preocupada com a existência ou não de um Deus. A natureza já nos responde o que poderia ser nossa “grande dúvida”. O equilíbrio do Universo, o amanhecer seguido do breu da noite, o vai e vem das marés, os vulcões cuspindo fogo das entranhas da Terra, o vento, o frio, o calor, todos os seres senscientes, cada qual com suas peculiaridades e sua busca incessante pela preservação e em outras infinitas coisas, mais pequeninas, mais sutís e mais determinantes como o amor, o ódio, os impulsos, os medos. Tudo isso denuncia a existência de um ser superior, de uma “consciência cósmica” que impõe vitalidade e harmonia ao todo.

O que realmente me preocupa é a existência do homem tal qual ele é: dotado de inteligência e raciocínio que lhe impõe uma busca incessante de “algo”, que acha, o tornará feliz. Muitos pensadores e filósofos ocuparam-se com esses “porquês” e a escassez de respostas ou sua imensa produção, nunca tiveram o poder de apaziguá-los.

Vive o homem perplexo diante da grandiosidade do que seria a finalidade da sua existência, contraposta à certeza que um dia a morte põe um ponto final em tudo, independente do estágio em se encontre o que o “trouxe” até aqui: projetos, filhos, profissão, ideais, amores, desamores, anseios, arrependimentos...

Agora, a pergunta é minha. Tantos sentidos, tantos significados conferidos às nossas vidas e a morte, de um momento para o outro, esvazia e invalida tudo. Será? Tudo isto termina quando o último suspiro acontece?

Não tenho resposta. Nem a que me convença da existência de outro plano carregado de novos sentidos nem de que tudo acabe por aqui mesmo, que nosso destino é virar pó e lembranças, boas, más, marcantes ou, até que sejamos rapidamente esquecidos, por nossa vida ter sido tão vazia e rasa, que nenhuma marca indelével ou tênue tenhamos deixado na memória de alguém.

Assisti ao filme da vida de Chico Xavier. Obvio que não o vi esperando respostas às minhas perguntas, embora, o espiritismo e sua doutrina façam parte das minhas reflexões. O que impacta é a personalidade digna, humilde e insubmissa do médium. Insubmissa, não como sinônimo de arrogância ou a existência do menor vestígio de indignação ou impaciência com os homens ou com todos os empecilhos que enfrentou, mas sim pela tolerância, compreensão e condescendência que demonstrava frente às falhas humanas e às viscissitudes da vida. Sabia-se um espírito em evolução, uma pequena peça na engrenagem do “plano divino”.

Era humano. Tinha coragem de demonstrar medo. Sentia saudade das pessoas queridas que perdesse para a morte. Era vaidoso com sua aparência e, algumas vezes, com a fama que adquiriu. Mas, predestinado. Contava com a ajuda de seu "mentor", Emmanuel, para mostrar-lhe, impiedosamente, as falhas da sua humanidade incipiente.

Não vou falar das inúmeras “provas” que lhe foram permitidas mostrar aos homens atestando a veracidade da sua crença. Não. Não me cabe por falta de conhecimentos, por falta de convicção e por achar que, seu maior testemunho e sua verdadeira missão não teriam sido aquelas.

O que desconcerta o homem comum sentado na sala de projeção é a prova da existência, na vida real, da bondade incondicional, da humildade à prova de qualquer manifestação de força espiritual e da tolerância consigo e com todos, tanto os que o amavam quanto os que o criticavam.


No filme pode-se perceber, que Chico Xavier esteve neste planeta, sofreu, serviu, marcou e morreu. Morreu? Para seus seguidores espíritas continua sua existência em outros planos. Marcou a todos. Mas nem o letrado nem o ignorante pode provar que ainda “exista” em outras dimensões. Portanto minhas interrogações e a de milhares de seres humanos permanecem.

Além das projeções normais com os personagens, ao levantarmos das confortáveis poltronas da sala de projeção nos deparamos com o desconforto das nossas já viciadas dúvidas inquietando-nos e incomodando-nos na inércia do nosso tédio intelectual.

ALICE ROSSINI