terça-feira, 21 de agosto de 2012

SUAVEMENTE PORTUGUESA


Esparramada por sete colinas, como Roma, Lisboa e a lusitana Macau chinesa, a belíssima Olinda, síntese do esplendor multicultural e racial dos anos de glória do Império português, entre os séculos XV e XVIII, foi fundada em 12 de março de 1535 pelo ilustre fidalgo Duarte Coelho Pereira (1485 – 1554), primeiro donatário da Capitania de Pernambuco, a Nova Lusitânia, e conserva até os nossos dias a mágica atmosfera que fez florescer, nos trópicos do Atlântico Sul, uma grande nação – que, para muitos, é o imenso Portugal à brasileira. Olinda, surgida catorze anos antes da primeira capital brasileira, a baiana São Salvador, deve o nome à corruptela de uma expressão que Duarte Coelho teria pronunciado ao desembarcar nas praias marcadas por arrecifes, Ó linda!, diante de deslumbrantes colinas e vegetações. É a segunda cidade mais antiga do Brasil – São Vicente, na Baixada Santista, litoral de São Paulo, criada em 1532 por Martim Afonso de Souza (1490 – 1571), foi a primeira vila construída pelos portugueses nas Américas. Mas, ao contrário da localidade paulista, conserva-se, na arquitetura e no falar chiado dos habitantes, profundamente lusitana, como nos séculos em que foi capital de quase todo o Nordeste brasileiro.

Pude, mais uma vez, constatar e desfrutar da beleza de Olinda durante toda semana que lá passei, ao lado de minha esposa, Da. Andrea, entre 11 e 18 de agosto último, hospedando-me no centro antigo, próximo ao Mosteiro de São Francisco, à Igreja do Carmo, à Catedral, no Alto da Sé, e ao Seminário de Olinda. Das exuberantes colinas – ou mesmo das praias do Bairro Novo - avista-se a vizinha Recife, distante apenas seis quilômetros, porém, marcada pelas pontes, jardins e palácios construídos, entre 1630 e 1645, pelos ocupantes holandeses comandados pelo alemão Maurício de Nassau (1604 – 1679). O desembarque destes foi, entretanto, bastante trágico para Olinda, que, em 1631, teve praticamente todas as suas 22 igrejas e onze capelas incendiadas pelas tropas “iluministas” neerlandeses – que também saquearam a cidade antes de botar fogo em seu rico e precioso casario. Já então Olinda era denominada a Coimbra brasileira por ser o principal centro universitário da colônia portuguesa e onde havia sido professor de Retórica o Padre António Vieira (1608 – 1697), nascido em Lisboa e mais tarde radicado na Bahia, tido como o maior pensador português do século XVII.

A reconstrução das igrejas da antiga capital pernambucana (de 1635 a 1837) aconteceu no século XVIII e por isso muitas delas foram inspiradas – principalmente os altares – no barroco dominante à época, também presente em Ouro Preto e em toda as Minas Gerais, bem como em São Salvador. Suavemente portuguesa – a desafiar os buliçosos séculos da Idade Moderna -, Olinda deve muito, como toda a histórica Nova Lusitânia, ao gênio universalista do fundador Duarte Coelho, nascido no Porto, na freguesia de Miragaia, um dos mais antigos bairros da Cidade Invicta. Ele recebeu a Capitania de Pernambuco em reconhecimento pelos valorosos serviços prestados à Coroa portuguesa em missões na Índia, no Reino de Sião (atual Tailândia), onde foi embaixador, e na Malásia – chegando a construir em Malaca, então capital lusitana no território malaio, a bela Igreja Nossa Senhora do Outeiro. Enviado ao Brasil, em 1532, pelo Rei D. João III (1502 – 1557), expulsou da Baía da Guanabara os invasores franceses de Nicolas Durand de Villegagnon (1510 – 1571). Ao chegar em Pernambuco, trazendo toda a família, inclusive o cunhado Jerônimo Albuquerque, irmão de sua esposa, Da. Brites, além de vários fidalgos do Norte de Portugal e do Alto Minho, Duarte Coelho construiria a primeira igreja no país, em Igarassu, e daria início ao Ciclo da Cana-de-Açúcar. Voltaria a Portugal quase vinte anos depois, muito doente, onde morreria. Dois de seus filhos, Duarte Coelho de Albuquerque e Jorge de Albuquerque Coelho, foram gravemente feridos na tristemente célebre Batalha de Ksar el-Kibir, no Marrocos, em 4 de agosto de 1578, onde desapareceria o Rei D. Sebastião O Desejado (1554 – 1578). Os irmãos estiveram até o fim ao lado do último rei da Casa de Avis.

ALBINO CASTRO - JORNALISTA