UM ANO COM ELE
Sempre foi um sonho. Sabia que muitas etapas
teriam que ser cumpridas para que se tornasse realidade; formaturas, noivados, casamentos. Vieram, então as aposentadorias e uma casa quase
vazia. Um “script” conhecido e nada original.
Um cenário perfeito onde,
somente o frescor de uma criança poderia tornar mais alegre e cheia de nuances
as cores da minha vida.
Há um ano, aos vinte e sete
dias do mês de dezembro, nascia Pedro, meu neto, meu sonho. Acho que já escrevi
neste BLOG, que os sentimentos que invadiram meu coração eram imensos e
profundos, mas leves. Como energia limpa, livre das impurezas da existência.
Não me dava conta que era protagonista de apenas um capítulo da natureza que se
cumpria. Sentia-me imersa num milagre que só merece quem tem méritos nesta ou
em outras existências.
Sobre o olhar amoroso de toda a
família e para mim, especialmente, Pedro foi crescendo, crescendo e, com apenas
um ano de vida, já cravou
raízes profundas no meu coração. É como a maioria das crianças, inquieta. Dona
de um carisma incontestável, não tem uma pessoa que lhe estenda os braços que
ele não aceite o colo. É risonho e chora pouco. A curiosidade é uma das suas
mais marcantes características. Ouve tudo e observa todos os detalhes ao seu redor, no chão, nos
brinquedos, nas pessoas, até onde seus olhos alcançam. Tem o hábito de encarar as pessoas. Olha-as, demoradamente, nos olhos. Quando os meus encontram os seus, me
perco tentando imaginar
as interrogações, as exclamações e os sonhos que moram nos olhos de Pedro.
A terça feira me veste de criança, me despe de
cremes, hidratantes e perfumes e, com meu neto, reaprendo a brincar. No quarto
onde o tatame colorido alegra o cenário, no qual, juntos nos divertimos, já sou
intima do seu ursinho bilíngüe, o Ted e sei da sua predileção por um antigo
móbile onde um pássaro chilreia o “Noturno de Choppin”, fazendo-o sorrir aquele
“sorriso de rosto inteiro”. Sim, porque Pedro sorri com os olhos, bochechas e,
por enquanto, com os quatro dentinhos que enfeitam suas gengivas que se preparam,
a espera dos outros “companheirinhos.”
Sentada no chão, na quina do
armário para protegê-lo de acidentes, contemplo com a calma e com a solenidade
que o momento requer o desenvolvimento do seu equilíbrio, as modificações da
sua fisionomia, o enriquecimento das suas linguagens, as mudanças do seu olhar
quando sabe que está fazendo algo proibido ou no seu sorriso, quando sua determinação o faz alcançar
algo que lhe parecia impossível. Assalta-me um ingênuo desejo de congelar o tempo, que transmuta
os momentos em simples lembranças. Sinto uma saudade antecipada desta fase, onde cada vitória de Pedro, por
menor que seja é sempre compartilhada. Ah! Se eu pudesse perpetuar a
inocência do meu neto, mantendo-o inocente e longe da maldade dos homens!
Não escapa a minha percepção
quando o quarto de brinquedos já o satura e é chegada a hora de Pedro olhar,
através da janela, João
e Malu, seus amiguinhos, brincando no “playground”ou as luzes dos carros no
lusco fusco do entardecer. Ele gosta de ver o mundo, ainda uma montagem
incompreensível, mas
fascinante que, aos poucos, vai fazendo sentido.
Logo que escurece seus olhinhos
não desgrudam da porta da
entrada esperando “mamã”, única criatura capaz de devolver-lhe a vivacidade e a
energia.
Há um ano Pedro está na minha
vida. Logo que seu retrato foi emoldurado pelo porta-retrato que passou a morar
no meu criado mudo, todas as manhãs nos olhamos, e dele tiro forças para
levantar e enfrentar mais um dia, a estranheza deste planeta que Pedro encara
com um irrefutável senso de humor, parte do seu jeitinho de ser e que encanta a
todos que o conhecem.
ALICE ROSSINI