terça-feira, 13 de julho de 2010

VIVER É SENTIR


Falam do nascimento como um acontecimento traumático. E é. Não é à toa que o primeiro suspiro de um ser humano é acompanhado por um choro. Choro que nos acompanha em todas as fases das nossas vidas. Desde a primeira infância, nos afastamentos, ainda que temporários, dos nossos pais, à adolescência quando nos sentimos infelizes e incompreendidos ou quando encontramos o amor onde dor e felicidade são faces da mesma moeda, quando somando-nos tornamo-nos pais ou multipicamos-nos em netos, quando a velhice nos coloca diante da possibilidade concreta da finitude, até quando nossos filhos voam para viverem suas vidas e nos assaltam sentimentos contraditórios. À compreensão impactante do nosso alheamento ao que, certamente, experimentaram nossos pais quando a roda da vida girou também para eles, não raro lamentando suas perdas.

São sensações que só se tem consciência da dimensão quando são vivenciadas. E cada um as vivencia como quer e pode.

Quando falo em choro, me refiro ao ato de chorar como uma metáfora. Prantos são manifestações emocionais e não são só as negativas que as originam. Lágrimas, embora levemente salgadas, podem ter gosto de felicidade, de alívio, de ternura, mas também podem ser amargas como a saudade, o medo e a solidão existencial.
O ato de chorar é uma das mais contundentes manifestações de sentimentos em ebulição. Tanto apazigua quem o externa quanto inquieta a quem o contempla. Quantos sentimentos ruins não seriam enxaguados por prantos contidos e quantos bons sentimentos não seriam iluminados pela transparência cristalina das lágrimas?

É incível como os homens teorizam sobre todas as fases da vida, delas expulsando sentimentos e sensações que tanto as exorcizam quanto as engrandecem, ancorados na óbvia constatação de que acontecem, queiramos ou não. Assim, passam por todas elas enclausurados em crenças graníticas que os impedem de traçar suas próprias trajetórias, que as distanciam de paradigmas e condicionamentos já fossilizados pelo tempo, em que todo fechamento de ciclo, ou é bom ou é ruim. Maniqueísmo que engessa manifestações individuais surgidas da diversidade humana, que deveria nos aproximar em vez de nos estigmatizar.

Todas estas fases tem suas doses de dor e prazer. Mas podem ser dolorosas, principalmente, por não contarmos com a compaixão dos que já as ultrapassaram e, por saberem que sobreviveremos, banalizam nossas emoções. Ou por aqueles que já as ultrapassaram e não as vivenciaram. Por não mergulharem nos lagos misteriosos das emoções perderam a essência da vida que é sentí-la.

Entendo que este comportamento é determinado pela humanidade de cada um de nós. Determinados alheamentos são confortáveis trincheiras onde escondemos nossos sentimentos e quem de verdade somos. Quem as usa e sente-se bem, que as torne cada vez mais acolhedoras.

Quando virmos lágrimas escorrendo por faces conhecidas ou de outro alguém e ignorarmos o porquê de estarem sendo vertidas, não nos apressemos em debitá-las ao sofrimento. Corremos o risco de sentenciar pessoas à solidão por estar experimentando um momento de felicidade que poderia ser compartilhado ou de estar gritando, através do pranto “me ajude”, "não me deixe só”, “preciso de um respeitoso silêncio ou de uma confortável privacidade”.

Fiquemos, pois, atentos aos semblantes dos que nos rodeiam. Somos todos humanos, vulneráveis, às vezes fortes às vezes fracos e a roda da vida não sofre do mal da iniquidade.

ALICE ROSSINI

9 comentários:

Sergio Gomes disse...

A cada dia vc está escrevendo melhor, parabéns.

Penha disse...

Concordo com o Sérgio, cada texto seu é uma surpresa mais agradável. Lindo depoimento e emocionante convite a todos nós, humanos ou não, a olharmos para os lados com o coração aberto

Lú disse...

A mim importa menos a erudição do texto do que a direção para onde apontam as palavras, que no caso conclamam a um olhar atento para a pessoa ao lado, para o alem de si mesmo, coisa rara e em franca extinção nos tempos atuais.
Querer mais seres humanos sensíveis ao que - e a quem - os rodeia é utopia, é quase revisitar o ser humano como o sabemos hoje; mas, diante de tantas intolerâncias, seria querer demais ter mais gente como você nesse mundo??

Lú disse...

P.S. Esqueci somente de lhe mandar um beijo, amiga!!

ZEUS disse...

Sou seu tiete. Pena que não tenha o dom para escrever o quanto suas crônicas me atingem. Sinto que existem pessoas que não vivem nem vem a vida de forma diferente da média mediocre, normal e irritante. Voce me parece uma pessoa acima de tudo corajosa. Pois so quem é muito corajoso diz o que pensa

AMANDA disse...

Que lindo seu depoimento e, como bem escreveu LU,um convite para que sintamos mais a vida com intensidade. Valorizemos nossos momentos, seja pra chorar ou pra sorrir ou as duas coisas juntas.

AMANDA disse...

Que lindo seu depoimento e, como bem escreveu LU,um convite para que sintamos mais a vida com intensidade. Valorizemos nossos momentos, seja pra chorar ou pra sorrir ou as duas coisas juntas.

AMANDA disse...

FIZ ALGUMA COISA ERRADA E MEU COMENTÁRIO SAIU DUPLICADO (RISOS)

Anônimo disse...

Muito bonito o texto. Parabens