segunda-feira, 30 de maio de 2011

IDAS E VINDAS

Assistindo ao"talk show” comandado pelo Jô Soares, ouvi da apresentadora Astrid Fontinelle um projeto de um programa que tem um cenario inusitado: os aeroportos. Não sei qual, se Guarulhos ou Galeão. Pouco importa. A realidade que a apresentadora quer mostrar é o tumulto emocional que acontece, a qualquer hora e todos os dias e que quase ninguem registra, no lugar, cujo objetivo é administrar as idas e vindas de pessoas da forma mais rápida.

A percepção da apresentadora desvia-se dos mostradores eletrônicos, de Chegadas e Saídas e sua sensibilidade eleva-se para as emoções das pessoas que dependem da precisão dos aparelhos. Pessoalmente, já as tinha registrado, observando suas emoções. Obviamente, já passei pelas duas experiências algumas vezes na vida.

Claro que há uma enorme ansiedade numa despedida muito temida ou numa chegada muito desejada. Há o medo que, se o afastamento foi prolongado, para onde e em que a pessoa amada transformou-se, seja filho, irmão, pai ou amigo. Se o avião atrasa ou se e o esperado demora de aparecer, não é raro irem ao balcão das Companhias de Aviação ratificar o que leram nos paineis eletrônicos. Querem ouvir de outro ser humano que, quem esperam, chegará. Querem o conforto da certeza.

Se o momento é de despedida, o beijo tem que ser o mais gostoso e demorado e o abraço deveria ter o poder de colar um corpo ao outro. As falas são desencontradas, nunca se diz o bastante e o afeto eterno é prometido.

Se o momento é de chegada, passada a ansiedade de reconhecer quem está sendo esperado, há o olho no olho. Serão aqueles olhos de tempos atrás? Então, com instinto felino, corremos para um abraço, algumas vezes, tímido e expectante, embora o calor ou a frouxidão do outro abraço falem mais que milhares de palavras.

Nos dois casos, desejos são frustrados ou alimentados pela imaginação ou pela esperança que tudo continue como antes.

O importante disto tudo é que, justamente neste ambiente que se propõe a levar e trazer pessoas rapidamente através de uma máquina ousada, que fere a lógica humana, é onde pessoas despem-se de todas as muralhas que as defendem e as separam do que há de mais verdadeiro nelas, os sentimentos. É onde há a promessa de que tudo será perdoado, tudo será conversado, onde chorar não é sintoma de fraqueza e a mistura de sorriso com lágrimas a receita perfeita.

É no santuário da formalidade, da voz profissional e dos sorrisos impessoais dos funcionarios de atendimento, de auto-falantes avisando as horas de embarques e chegadas de aeronaves, onde acontecem manifestações de emoções mais contundentes e sem regras pré estabelecidas. Se alguém vai para muito longe, prometemos a nós mesmos, fazer um ar “blazer”, dizer que “o tempo passará depressa”, que “é um privilégio passar pela experiência” e outros clichês que, naquele momento, não convence quem vai nem quem fica.

Se alguém chega, não queremos recebê-la com uma enxurrada de lágrimas, o sorriso é a promessa e a reação mais “adequada”. Entretanto, na hora em que estamos frente a frente com as realidades da ausência tão longa ou da chegada em que a espera começou na partida, tudo em nós se derrete e transforma-se na mais sincera, despudorada, ilimitada e, muitas vezes, descabida reação.

Achei a ideia genial porque, assim como eu, muitas pessoas devem sentir necessidade de um ombro ou um ouvido, ainda que não muito íntimo, para compartilhar o que nos vai na alma. Registrar emoções sem roteiros predeterminados é uma ideia pioneira, que empresta aos que frequentam aeroportos pelos dois motivos, um espaço para compartilhar suas emoções sem que sintam-se solitarias ou inadequadas.

Se é que alguém que recebe ou "despacha" quem ama pense nestes detalhes.

Alice Rossini

7 comentários:

Luciano Augusto disse...

COM CERTEZA...rs

bjs

Sônia Maria Azevedo Costa disse...

É isso mesmo. Nos aeroportos vemos de tudo. Casais abraçados e a mulher sempre chorando (risos), gente querendo ver através de portas fechadas, abraços demorados e beijos apaixonados até pessoas pelas quais ninguem espera. Pega um taxi e vai embora.
Seu relato foi emocionante. Também ouvi o programa, achei a ideia otima e não sei como, em tempos de "realitys" ninguem ainda havia pensado nisto.

Sônia Maria Costa disse...

Alice Rossini, descobri seu BLOG, por acaso. Através de uma relação de BLOGS AMIGOS de um outro BLOG.
Gostei muito!

Penha disse...

Assisti também ao programa e confesso que nem dei muita importância. Hoje, lendo seu texto, percebo o quanto a sensibilidade é capaz. De enxergar nas coisas mais simples, como "bisbilhotar" aeroportos, sentimentos, emoções,lágrimas de alegria ou de dor. Enfim, a vida!
Parabéns pela sua sensibilidade e pela forma bonita com que conseguiu registrá-la

Aparecida Matos disse...

Ja passei por momentos dolorosos de embarcar, por muito tempo pessoas queridas como, por muitas emoções por reencontrá-las ou receber amigos e parentes que não via há muito tempo. Voce descreveu com precião e fidedignidade o que se passa nas nossas cabeças nas duas situações . Parabéns pela sensibilidade de ao ouvir a ideia transformá-la numa crônica tão emocionante.Nela me vi de todas as formas

Anônimo disse...

Olha, este texto foi um dos melhores do seu Blog que acompanho mas me sinto sem graça de comentar

AMANDA disse...

Mais uma vez voce conseguiu ser, além de precisa, poética