sábado, 22 de janeiro de 2011

A BELEZA MORA NOS FRAGMENTOS

A beleza como um conceito subjetivo obedece a padrões estéticos que variam de acordo com o contexto histórico, a cultura e, tanto no primeiro como no segundo casos modificam-se segundo os valores de cada sujeito neles inserido.

Sua subjetividade, entretanto, permite abstrações que podem tanto ampliar como reduzir os conteúdos que compõem, tudo que pode ser classificado como belo.

Quero, neste texto, olhar apenas por um viés, por uma fresta, por menor que seja, que permita a visão da beleza. Aquela que muitas vezes pulveriza-se de tal forma que para percebê-la há que haver atenção plena. Sim, porque para enxergar a beleza a que me refiro é necessário estar muito atento. Por ser fugaz, por durar frações de segundos, por ser a sensação provocada por abstração, além de um olhar imprevisto ou por uma convergência de circunstâncias imprevisíveis. Portanto, é muito provável que estejamos rodeados de beleza e nem a enxerguemos. O que é uma pena, num mundo tão cheio de coisas feias e que inspira sensações piores ainda.

Então vejamos. Hoje a percebi numa jovem mãe, na sua fisionomia ao falar de como foi surpreendida pela natureza do amor que sentia pela sua cria. Seu rostinho suave transformou-se numa fácies que evidenciava a nossa semelhança com qualquer outro animal que habita o Planeta. Quando a olhei, percebi que o universo está contido nas pequenas coisas, na união das diferenças que convergem para o Uno. Porque a ternura que iluminava aquele rosto poderia, a qualquer momento, a qualquer sinal de perigo, transformar-se na ferocidade de uma fêmea recém-parida que rosnaria e não hesitaria em atacar com a voracidade de uma leoa. Cheguei a perceber naqueles dentinhos, naquela boca jovem, que os caninos poderiam alongar-se e suas mãos que me pareceram macias poderiam transformar-se em garras de uma fera e, num piscar de olhos, reaverem sua maciez original.

Vejo, quando atenta, lealdade na luta entre abelhas e beija- flores por algumas gotas de água açucarada. A vida ansiando por si mesma. Tal qual uma miragem, confunde minhas retinas a harmonia de um belo corpo correndo pela rua, entre carros, indiferente aos olhares, ao gás carbônico, aos raios ultravioletas, na crença de que o movimento, equilibrado e perfeito, lhe agrega mais beleza.

Paradoxalmente, a contemplação de um corpo sem vida pode mostrar a beleza escondida na dor da renovação, onde o perecível revela-se necessário, prestando à eternidade um enorme favor. Nesta compreensão, por mais dolorosa que seja sua exposição, a beleza de uma suposta lucidez que a vida imponha, só acontece num laivo de segundo. Ainda que, depois deste momento só a dor e o inconformismo nos acompanhem.

Sentimentos e emoções que uma música, um perfume, um rosto nos provocam ou quando, até a visão de uma palafita que o por do sol desenha no céu, em silhueta, que poderia ser real ou estar colada em óleo e cores sobre uma tela. Talvez, até num muro que sirva de proteção para um desvalido sobre o qual um grafiteiro transformou em espelho onde refletiu um poema inteligível, que teimava em atormentar sua mente.

Nestes instantes fragmentados, em que nos alienamos de nós mesmos e derrubamos as fronteiras, entre nós e a sensação ou o objeto da nossa contemplação, é quando ela - a beleza, que ignoramos quando estamos desatentos, preenche nossa vida dos sentidos que buscamos no óbvio, no visível, no objetivo dos objetos ou na utilidade das ações.

A vida e seus desdobramentos, a que chamamos de destino, acontece em fugazes milésimos de segundos. São como estrelas. Sua luz são espectros de uma estrela peregrina que já se perdeu no infinito...

ALICE ROSSINI

10 comentários:

LÚCIA disse...

Filha,

A leitura do seu texto sobre - A BELEZA reportou-me a uma frase de Pablo Picasso:

“Há pessoas que transformam o sol numa mancha amarela, mas há aquelas que fazem de uma simples mancha amarela o próprio sol”.

Realmente, há pessoas que têm a visão direcionada, apenas, para o que é “feio ou negativo”.
Alguém chega alegre e diz-lhe uma boa notícia, ela sempre tem um “mas”- “É bom ter uma boa nota na prova, é ótimo ganhar um prêmio... mas... você deve continuar estudando mais; não esbanje dinheiro”. “Esta pessoa parece alegre, mas... Cuidado – “alegria, principalmente de pobre, dura pouco”... A alegria “turva” e o “sol vira, apenas, uma mancha amarela”.

É assim, nunca participa da alegria do outro, nem prolonga, por algum tempo, aquela agradável sensação.

Realmente, filha, seu texto está irretocável. Parabéns!!!!
Na verdade, o ser humano é um “báratro insondável”.

Beijos,

Sua mainha

IZABEL disse...

Irmã,

A beleza é um conceito tão subjetivo que às vezes deixamos de percebê-la nas pequenas – grandes “coisas”. O seu texto mais uma vez nos faz REFLETIR... E o refletir nos faz rever e revisitar conceitos e pré-conceitos para refazer... Reforçar... Ou refutar.

Obrigada mais uma vez.

Você escreve o que muitos pensam, mas não traduzem nesta linguagem.

Bjsss,

Bel

Penha Castro disse...

Privilegiada. Este é um dos principais adjetivos que posso lhe dar. A visão que possibilita enxergar tantas sutilezas, tanta coisa que realmente dá sentido à vida e nem percebemos é uma vocação de artistas como voce.
Não lhe aconselho a escrever um livro porque voce já o fez. E este instrumento,a internet, por uncrível que pareça é o mais democrático. Privilegiados também somos nós, que tenmos acesso à sua subjetividade

Maria Eugênia disse...

Queria te conhecer pessoalmente. Mas entendo que no mundo da internet muitas vezes devemos nos contentar em conhecer as pessoas através do que escrevem. E por falar em escrever quero lhe dizer que sou sua leitora assídua e isto me faz achar que lhe conheço. Uma amiga de um amigo que recebe suas crônicas me indicou seu blog e fiquei "viciada".
Isto tudo é para dizer que ainda que voce não escreva o que sinta é porta voz de quase tudo que sinto. Sou sua fã!(risos)
Muitas vezes não faço comentários porque não encontro palavras para expresaar meus pensamentos

AMANDA disse...

Esta beleza que está no íntimo da coisas só vêm os que tem a sensibilidade à flor da pele. Por favor, não pare nunca de escrever.
Talvez se fôssemos, como voce diz, um pouco mais benevolentes até com as coisas ruins, tirássemos da vida um pouco mais de prazer.

Luiz Augusto Vaz disse...

Minha Querida Escritora.

Adoro seus textos pois expôem sua sensibilidade.Você nos enchem de orgulho.
Um beijão e continue nos brindando com pérolas de literatura

Tio Luiz

ZEUS disse...

A beleza mora em cabeças e olhares sensíveis como o seu. Maravilhoso texto

RICARDO disse...

SEM PALAVRAS PARA COMENTAR UM TEXTO, CUJA SENSIBILIDADE DA AUTORA, NOS EMOCIONA E NOS FAZ PENSAR.CONTINUE COLOCANDO NO "PAPEL" TUDO QUE SE PASSA POR ESTA CABEÇA PRIVILEGIADA

Rose disse...

ADOREI! Parabens, este foi um dos melhores que voce escreveu.
Beijos

Anônimo disse...

Adorei! Continue escrevendo.