segunda-feira, 17 de janeiro de 2011

"BOM DIA, TRISTEZA!"

Muitos confundem tristeza com depressão. Como a confundem com falta de senso de humor oU mau humor, por sinal, já reconhecido, por algumas correntes da Medicina como doença; confundem euforia com alegria, indiferença com serenidade, apatia com preguiça e, por aí, vai. Quero, entretanto, ater-me à tristeza, a que se cronifica ou tem uma regularidade teimosa. Que pode transformar-se numa doença grave e com desdobramentos mais graves ainda.

Manifesta-se de milhares de formas como, milhares de motivos podem deflagrá-la. Longos silêncios, sentimentos de angustia cujos efeitos físicos são suores, taquicardia, sensação gélida na coluna vertebral, dores no estômago, secura na boca e na garganta. A vontade de ficar mais invisível do que já se sente, acompanhados por um forte sentimento de inadequação que se traduz em não saber como se comportar nos lugares, até sentimentos de rejeição, provocados pela dúvida eterna e atroz em relação aos sentimentos dos outros.

O pior momento para quem está triste é o amanhecer. Um dia inteiro pela frente. Vinte e quatro horas para serem enfrentadas e a insegurança de como lidar com os imprevistos, tão comuns na vida dos “normais”, mas na dos “tristes” assumem proporções catastróficas.

Este texto é dedicado aos tristes porque eles ainda sofrem de um preconceito que tornam seu sofrer um pecado.

Muitas vezes a causa do sofrimento é subjetiva, às vezes tem nome e sobrenome fazendo-os sentirem vergonha diante da impotência, da falta de atitude, dignidade, coragem, ou comodismo que os impedem de dar uma reviravolta na própria vida, ainda que as mudanças lhes tragam perdas que não farão nenhuma diferença na profundidade do abismo em que se encontram. Ninguém, a não ser quem está no “olho do furacão”, imaginário ou real, reconhece que o desconhecido e o novo, causam medo e insegurança. Portanto, todos se sentem no direito de julgá-los. À luz de sua lucidez e de conceitos de felicidade e de direitos, particulares.

Num mundo infestado de violência e doenças, agredido por catástrofes naturais e outras “moléstias” próprias do existir, ser triste por algo indefinido ou por um motivo que, bem ou mal tem solução, ainda que duvidosa, ainda que difícil e dolorosa, causa vergonha e estigmatiza o sofredor.

A felicidade, o sucesso, o bom humor, o alto astral dos “normais” esmagam os tristes, fazendo sentirem-se ingratos por terem acesso a tudo e não valorizar nada.

O trágico resultado são pessoas que se desintegram, expondo de forma equivocada, coberta pelos véus de versões injustas suas dores, em algum momento da vida sentida por todos embora, muitos sejam equipados de um repertório emocional para enfrentá-las ou, uma boa parte delas, nem as reconhecem.

Ao se desintegrarem e se desgarrarem da manada, os tristes isolam-se e negam-se uma possível solução pois, perdem a lucidez e o equilíbrio por detonarem as pontes que poderiam ligá-los às pessoas queridas que fazem parte da uma realidade que, por mais rejeitada que seja, insiste em fazer parte da sua vida.

Sinceramente, não sei qual a solução para os tristes. O mundo está ocupado com a objetividade, com a concretude dos problemas e com a solução fácil para eles. Está triste? Ocupe-se! Religue-se ao divino: ”Deus proverá!”. Tome um antidepressivo que melhora. E não pense! Porque pensar dói, incomoda quem pensa e os que os rodeiam.

Esqueçam, imediatistas! A contagem do tempo dos tristes nada tem a ver com a euforia e a velocidade do resto do mundo. Esqueçam suas idéias e soluções “fast food” roídas pelas traças que destroem até livros de auto-ajuda. Não falem do que não sabem. Os tristes precisam de acolhimento e respeito para sua subjetividade. Seus motivos, se objetivos forem, podem morar nas prateleiras dos sótãos de seu inconsciente, mas sempre escapolem. E em formas contorcidas de dor.

E como doem!

ALICE ROSSINI

9 comentários:

Ana Clara disse...

Esse foi seu melhor texto até hoje.

Sérgio Gomes disse...

Você tomou muito bem emprestado o título do livro da escritora francesa Françoise Sagan, o "Bomjour Tristesse". Foi um dos livros marcantes da nossa geração, virou filme, etc. Desde que lí, sempre associei a sensação de tristeza com a história existencial da adolescente Cécile...Sagan escreveu aos 18 anos - parece que muito influenciada por Jean Paul Sartre e Simone de Beauvoir - retratando a solidão, o tédio, a tristeza, numa demonstração de que os prazeres da vida são poucos e limitados a lampejos de felicidade, estando o homem fadado ao sofrimento. O livro talvez seja o principal produto da geração desesperançada dos anos 50 e 60,jovens que viviam mergulhados na "fossa" existencialista. Parabéns pelo artigo.

Sérgio Gomes disse...

Desculpem o vacilo na grafia do livro: é "Bonjour", claro, e não "Bomjour" como saiu escrito. Pardon.

AMANDA disse...

Que texto maravilhoso! Voce se superou na sua capacidade de falar por milhares de pessoas angustiadas, insatisfeitas que, com ou sem motivos vivem por aí, fingindo o que não sentem.
Fiquei emocionada e me identifiquei muito.Parabéns!

Rose disse...

Não imagine que a tristeza é defeito de fracos,pessimistas, ingratos. Ela é uma característica dos fortes e humildes. Humildade é força, é grandeza de espírito e coragem de se enxergar gente. Ser gente é difícil porque vive entre o sorriso e a lágrima. O difícil é torná-los normais e saber que só sofre e sorri quem vive com intensidade.
Seu texto está emocionante porque atinge, sem distinção, a todos, humanos ou não.
Parabéns!

Penha disse...

Concordo com Ana Clara. Este foi o texto mais bonito que escreveu. Foi o mais emocionante e, tenha certeza, o que mais me identifiquei. Creio que muito mais pessoas que voce imagina viu nele, estampados seus pensamentos, suas angustias e seus anseios. Quando o que escrevemos encontra ressonância no coração de muitos podemos nos sentir realizados.

Anônimo disse...

Este texto ao mesmo tempo que me deu um enorme alento pois me fez não me sentir muito só mas, me deixou mais triste do ja ja me encontro, pois está tão lindo, tão lindo, que me perguntei: para que existe tanta gente sensivel neste mundo?

RICARDO disse...

BOM DIA TRISTEZA! PERFEITO! PELO QUE SIGNIFICOU O FILME HOMÔNIMO E PORQUE, COMO VOCE DIZ, AO MANHECER HÁ SEMPRE O REECONTRO COM A VIDA EM TODOS OS SEUS ASPECTOS, A TRISTEZA, PRINCIPALMENTE.
BELO TEXTO. CONSEGUIU FALAR DE ALGO, APESAR DE COMUM, MUITO RUIM DE SE SENTIR, COM A LEVEZA DA SUA SENSIBILIDADE.

ZEUS disse...

Lindo este texto. Parece um poema. Foi um dos textos mais bonitos
que esreveu. Garanto que muito gente se identificou.
Parabéns, bela.