domingo, 8 de novembro de 2009

DERRUBANDO MUROS


Nove de novembro de 1989. O mundo assiste a uma multidão enfurecida derrubar um dos monumentos mais vergonhosos da história da humanidade - o Muro de Berlim. Uma cruel parede de concreto, arame farpado e outros “aparatos” mortais que, mais que separar estados com regimes divergentes, dividiram famílias, distanciaram amigos, separaram amantes. Seres humanos que perderam o direito de se verem para concordarem, para divergirem, para produzirem arte, conhecimento, alimentarem dúvidas, responderem perguntas. Pouco importa. A ninguém é dado tirar de nenhum ser o direito de interagir com seus semelhantes. Apenas os sociopatas, depois que a justiça lhes seja aplicada.

Mas a história tem uma força que é maior que qualquer idéia que a deturpe. Porque quem faz a história são os homens. E homens, sejam de que origem for, têm fome de liberdade.

Este muro, o de Berlim, para ser derrubado, vários fatores e circunstâncias históricas determinantes foram acontecendo ao longo de um período conflituado.

Sabemos que ainda existem muros, visíveis e invisíveis, que cerceiam o direito de ir e vir das pessoas, entretanto, muros bem mais altos e mais impiedosos existem, ainda incólumes, dentro de nós. Muros que erguemos com o concreto e as pedras das nossas omissões e fraquezas. Muros, cujos pedregulhos vão se amontoando e, por desatenção ou por comodismo, vão ocupando nossos espaços vazios e, sorrateiramente, crescem e transformam-se em muralhas quase que intransponíveis.

Dentro de mim tenho muros. Muros de preconceitos, de certezas graníticas que assumi como verdades imutáveis. Muros que me sufocam e me impedem de ver outros lados que, tenho certeza, a vida oferece.

Assim, como tenho consciência das minhas muralhas, há quem as desconheça. E, infelizmente, só um aguçado e impiedoso olhar de si para si, é capaz de perceber sua extensão e o quanto ele nos cega e nos impede de sermos felizes.

Como o muro de Berlim foi derrubado com a força do sofrimento, da saudade, do sacrifício e da coragem em aceitar verdades insuportáveis, para nossos muros internos ruírem, é necessário que usemos os machados da nossa autocrítica, e, pedra por pedra, os desconstruamos e os sangremos até que a última pedra transforme-se em pedaços insignificantes.

Assim, como em Berlim, a cicatriz que o muro da separação marca suas ruas repletas de histórias tristes, temos que assumir e cuidar para que nossas cicatrizes transformem-se em sinais redentores


ALICE ROSSINI

10 comentários:

Albérico e Lúcia disse...

Excelente texto! Especialmente o final. Parabéns!

IZABEL disse...

Alice,

Concordo plenamente com o comentário dos nossos pais! O final do texto foi fantástico!

Pois é, devemos antes de tudo derrubar os nossos muros internos... Entrar em contato com as nossas “sombras”. O EGO está para a sombra como a luz para a penumbra, é a sombra que nos faz humanos. Devemos estar atentos para a dissociação entre os lados claros e escuros da nossa psique. Atrás dos nossos muros, das nossas sombras existe a LUZ!

Adorei!

Beijos,
Bel

Fernando Trovador disse...

Alice

Lindo! Brilhante.
Me regozijo por haverem pessoas que tem a sensibilidade de identificar redenção em velhas feridas.
Infelizmente, na Palestina ainda se elevam muros mais mortais e separatistas que esse. Muros que separam familias, irmãos, credos, raças e vizinhos. Um muro de uma vergonha muito maior.

Fernando Trovador

Penha Castro disse...

São estes muros internos que temos dentro de nós, como disse nossa Alice, que ainda mantêm em pé e edificarão outros, "visíveis" e vergonhosos afastando um homem do outro e de si próprio. Vixe, virei até poetisa, na cola da nossa amiga (risos)

Analogia brilhante!

Mariana disse...

Relacionar a queda do MURO DE BERLIM com nossos preconceitos e amarras internas é tarefa para muito poucos. Só sua sensibilidade é capaz de fazer este link.

Concordo que a queda dos muros que os homens erguem para separar-se uns dos outros são frutos dos entulhos que acumulamos dentro de nós.

Adorei.

Anônimo disse...

GAROTA, VOCE ESTÁ CADA DIA MELHOR! ESTE TEXTO ESTA EXCELENTE.

Ricardo disse...

Alice,

Ontem, depois que assisti as reportagens na televisao sobre a queda do muro, pude perceber que voce falou na sua crônica, de todos os aspectos abordados pela imprensa e ainda foi mais fundo, falando de coisas que todo mundo vê, sente mas, so voce disse.

Olha, estou impressionado com esta sua capacidade!

Gostaria de escrever mais mas nem sei o que dizer.

Anônimo disse...

MUITO BOM, VOCE É DEMAIS. COMO VOCE VIVE FALANDO QUE DEVEMOS ELOGIAR NO BLOG, ESTOU FAZENDO ISTO!

Sandra Cristina disse...

Adorei o texto! Muito pertinente.
bjs,
Sandra

Vitória Régia disse...

Estou sem internet mas, não larguei o vicio de lhe visitar

Adorei!