terça-feira, 5 de maio de 2009

PODEMOS TER ESPERANÇAS?


Hoje acordei triste.

Sentei-me à mesa, de onde tenho a primeira impressão das cores do dia e tudo parecia igual. Vi o mesmo e fiel beija-flor viciado no néctar açucarado à sua espera na varanda. Observei micos traquinas a desafiar a morte próxima a fios de alta tensão. Reverenciei o imponente jambeiro que, a depender da época do ano, tece um tapete cor de rosa sob sua copa. Tudo lá, igual a todos os dias.

Tanto eu como o mundo fora daquele “minimundo” que eu observava, estávamos doentes.

Quando comecei a ler o jornal e conectei-me a Internet, percebi o quanto este hábito, tão normal nos dias de hoje, poderia ser nocivo naquele dia em que amanheci triste. Logo, a crueza das notícias me atingiu.

Quando achávamos que a crise financeira e o aquecimento global seriam as grandes e últimas ameaças à vida e à sobrevivência do planeta, nos chega a notícia de mais uma doença real, letal e agressiva. A Gripe Suína ou Nova Gripe, como queiram chamá-la.

A globalização cobra seu preço e, num mundo cujas fronteiras estão cada vez mais elásticas e vulneráveis, tanto prolifera o bem, quanto ataca o mal, com a mesma rapidez e agressividade.

A “guerra” do excesso de informações, o entendimento desvirtuado delas ou a sua ausência, todos estes elementos associados ao medo e à deficiência na educação sanitária, até dos ditos “educados”, fazem com que ouçamos os noticiários como se juízes estivessem nos sentenciando à morte.

Meu filho acaba de casar-se. Outro, já casado, sonha com filhos.
Nós, seus pais, não abdicamos do direito legítimo de vê-los multiplicarem-se. Este singelo sonho contamina-se pela incerteza e transfigura-se numa postura suicida e egoísta. Que mundo entregaremos aos nossos netos? Meus, e de todos os habitantes do planeta?!

Até a ciência, na qual depositamos todas as nossas esperanças de salvação, auto isentando-nos da sensatez do nosso comportamento como seres “inteligentes”, a cada dia é surpreendida pela força da vida. Teimosa e irreverentemente, manifesta-se de forma indiferente e vingativa com relação aos maus tratos que lhe são infligidos.

Quando Barack Obama foi eleito, o mundo regozijou-se, depositando em suas mãos poderes messiânicos: o velho e antigo movimento humano de voltar-se ao colo do pai protetor e misericordioso. Tão logo tomou posse, deparou-se o “presidente redentor” com um inimigo microscópico, invisível e sorrateiro. Que pode um homem ou um governo contra um vírus que burla fronteiras e atravessa mares? Como foi um vírus poderia ser algum acidente ecológico ou outro fato que superasse sua capacidade de intervenção.

Não adianta enclausurar-nos em bolhas protetoras nem transferir responsabilidades. Frequentemente, as redomas mostram-se vulneráveis e responsabilidades são divididas, não transferidas.

O “Universo paralelo”, no qual, tento em vão, esconder-me da realidade da vida mostra-se ineficaz quanto a mim e nocivo quanto aos outros.

Entretanto, neste mesmo dia, assisti à apresentação de um comovente trabalho, no qual, psiquiatras do mundo inteiro foram à República de Cabo Verde prestar serviços médico-psiquiátricos às populações carentes. Fiquei emocionada e mais feliz.

É gente pensando na gente. No crioulo cabo verdiano, uma forma de amor que transcende aos seus conteúdos restritivos, amor “di n´ crê tcheu.” É o amor pela terra e por todos os seres que a habitam.

Uma corrente de pensadores modernos acredita no que chamam de “Singularidade do Amor”: através do meu humilde entendimento, o ser humano, independente da cultura, da classe social ou econômica onde estiver inserido, possui necessidades comuns. Precisamos todos de água, oxigênio e, entre outras coisas de... amor, para sobrevivermos.

Saber que tem gente séria, que alia competência e generosidade de maneira eficaz, capaz de desacelerar nosso processo de autodestruição, de repente, fez com que meu dia terminasse menos triste.

Também, como alguns de vocês, restrinjo-me ao medo e à indignação. Isoladamente, temos muitas opções para coibir alguns abusos, fazendo o trabalho da “formiguinha”.

Pelo menos na fábula, quando todas as formigas se unem, não lhes faltam comida e abrigo no inverno, por mais rigoroso que seja.


ALICE ROSSINI

4 comentários:

Anônimo disse...

VOCE É UMA MULHER SENSÍVEL E INTELIGENTE. NÃO PODERIA VIVER COM INDIFERENTE DIANTE DE TANTA MISÉRIA. TAMBÉM ME SINTO ASSIM, TRISTE, DE VEZ EM QUANDO.

Vitória Régia disse...

Amiga! Seu BLOG está cada vez melhor! Adorei a "exposição" das suas inquietações e angústias. O mundo está horrível mesmo! Mas, tenho certeza, que seus, nossos netos, vão encontrar um mundo melhor. E que sejam muitos, voce merece! rsrs

Selene May disse...

voce ótima, como sempre; a foto tambem, mas registro minha restrição a cerveja de marco
bjs carinhosos

izabel disse...

Alice,
amei o tema – ESPERANÇA!

A Psicologia decifra esperança por algo que é inerente aos nossos desejos, enquanto a espera é fato neste tempo do desejar. Já os filósofos a esperança se explica em tese sentimentalista, fundamentada por variantes como a emoção e a razão, é fato pré concebido em idéias, que só serão atos quando damos ao mundo o que esperamos ter e do mundo o que esperamos dar...

Para os Sábios significa ter o tempo de amanhã nas mãos das palavras de hoje. É futuro em pensar – É presente em agir. Para os Céticos, esperança é lei de ação e reação. Para os Otimistas não há melhor etimologia para a palavra esperança que fazer dela um livro, como fariam os poetas em metáforas e os músicos uma melodia... Esperança para o Artista é criação!

Enfim, para os Amantes esperança é a “eternização” do amor...

Para mim, a esperança é uma semente, germinada com os desejos e colhida com atos. É alimento que a mente necessita para nutrir o coração... Daí achar que sempre devemos ter esperanças e diante deste contexto global, não deixar de transformar em atos, como você se referiu a “metáfora” da formiguinha!

Beijos,
Bel